A História é um caminho, um trajeto percorrido. Em Maricá, essa trilha no tempo está sendo materializada numa escadaria que liga o Centro ao Boa Vista. O local está ganhando murais desenhados pelo artista plástico William Barreto, de 41 anos, o Seralón de Maricá. As pinturas contam sobre os habitantes, a miscigenação, a colonização e urbanização do município. E, assim, constroem um futuro melhor para o bairro.
— Essa escadaria era horrível. Frequentada por usuários de drogas, suja, escura. Os degraus eram quebrados... Até que num dia de chuva eu estava subindo com a minha filha. A água descia com força e ela comentou que só faltavam os peixinhos — contou William, que chegou em casa com a ideia de pintar os peixes para mudar o caminho para a filha.
— Eu achei a pintura original verde e cinza. Moro aqui desde 2006 e nunca tinha visto essas cores aqui! Os vizinhos, primeiro, acharam que eu fosse maluco. Depois foram aparecendo para contar histórias que viveram aqui — disse o artista.
Foi assim que nasceu o projeto de retratar a trajetória da cidade nas paredes e degraus da escadaria da Boa Vista. A vizinha da parte baixa se encantou e ofereceu a parede da casa para o muralista, junto com a oferta de tintas para o trabalho.
— Eu o conheci ali, abaixado limpando degraus. Puxei assunto, e abracei o projeto. Desde que começou, parei de encontrar cápsulas usadas para guardar drogas no meu quintal. A atmosfera é outra agora — garantiu a aposentada Luci Santana, de 53.
Atenção da prefeitura
Não foram somente os vizinhos que compraram os peixes de William. Desde o fim do ano passado, a Prefeitura de Maricá começou a reformar a escada. Limpou, iluminou e plantou até grama nos canteiros do novo point.
— Meu pagamento é ver as pessoas tendo uma relação nova com o espaço. As pessoas param aqui para ler, tirar fotos. Até rola uma comparação com o que Selarón fez pela Lapa, mas claro que numa proporção muito menor. Se um dia aqui for dez por cento do que ele fez, estarei realizado — avaliou William.
Selarón revestiu uma escadaria inteira na Lapa, no Centro do Rio, com azulejos coloridos de diversas partes do mundo. A obra é um dos cartões postais mais famosos da capital.
Menos cosmopolita, a parte internacional da escadaria de Maricá fica por conta dos desenhos de azulejos portugueses e dos negros escravizados que chegaram na cidade para as fazendas de café e cana.
— Aqui no Boa Vista mesmo tinha uma senzala. Os negros precisam estar representados, assim como os índios. Na parede da Luci vou pintar a estação de trem. A pesca milagrosa de José de Anchieta já tem lugar marcado, assim como Darwin, que passou por aqui também — enumerou o artista.