Se construir autoestima fosse fácil, Sigmund Freud não seria tão famoso. Estou exagerando, é claro, mas é fato que viver aqui na pós-modernidade líquida, com tantas famosas e esguias fazendo propaganda de lingerie e Gisele Bündchen sendo linda, magra e defendendo o meio-ambiente na capa da 'Vogue América', requer um bocado de tempo no divã para segurar a onda.
Conheço mulheres que deixam de ir à praia com vergonha do próprio corpo, outras que preferem suar debaixo do moletom a ter as curvas anunciadas pelas roupas justas da academia e até intelectuais brilhantes que só transam de luz apagada para que o namorado não veja o seu corpo real. É triste!!!
Obcecados pela juventude e por ideais estéticos inatingíveis para a maioria, criamos exércitos de mulheres insatisfeitas consigo mesmas, exauridas por tantas cobranças e continuamente em busca de qualquer coisa que lhes dê um mínimo de alento. E tome meditação, reza, ansiolítico, chocolate e Prem Baba.
Numa sociedade que associa o corpo magro à felicidade (falsa felicidade), não é estranhar que a Pesquisa Nacional de Saúde Escolar feita pelo IBGE, tenha revelado que uma em cada cinco meninas brasileiras com idade entre 13 e 15 anos se ache gorda ou muito gorda.
Mais de 30% das entrevistadas afirmaram ter o desejo de perder peso. Assim fica fácil entender por que o SUS interna a cada dois dias uma pessoa diagnosticada com bulimia ou anorexia.
Como construir autoestima diante de um quadro desses?
Historicamente, a civilização ocidental - essa entidade definida por homens brancos heterossexuais dos países dominantes - tem feito do corpo feminino um campo de batalha. A manutenção das estruturas de poder reinantes passa pela subjugação da mulher e de suas emoções e também pela objetificação da sua sexualidade.
Num país periférico como o Brasil, onde toda essa lógica pós-colonial se repete com atraso e um bocado de farsa, a sociedade que despreza corpos femininos gordos é a mesma que separa vaginas por cor em alto e bom som.
No filme "Sexy por acidente", a personagem de Amy Schumer ganha confiança inabalável depois de sofrer um acidente. A vida real não é tão simples: a autoestima não vem fácil e, quando vem, não é solução para tudo.
Por isso, o movimento body positive, espontaneamente criado por mulheres mundo afora, é uma importante ferramenta de debate e inclusão.
A aceitação do desejo feminino - por comida, por sexo e por voz - é condição sine qua non para uma sociedade saudável. Ou bailamos juntinho com ele ou nos tornaremos todos - homens e mulheres - um bando de histéricos. Não é mesmo, doutor Freud?
Texto adaptado: Pery Salgado
(jornalista e produtor cultural)