Pretendo tirar dessa escrita, todo o glamour atrelado ao mercado da arte, por que o processo artístico contemporâneo não se resume ao mercado de arte e muito menos aos respeitosos escritos de Ernst Gombrich. Este tendo escrito o mais famoso compêndio da história da arte, tremeria no túmulo nos nossos tempos de distopia.
Menos de 1 por cento dos artistas existentes do globo terrestre viveram com fartura material advinda de sua criação, destes, menos ainda entraram para a história. Mas seria a função da arte “entrar para a história”?
Como foi, como é a vida, desses 99% de anônimos, que com certeza alimentou de ideia e inspirações, esse 1 por cento que se sobressaiu? De que forma HOJE esse tal 1 por cento se estabelece?
Ainda em cima da ideia esdrúxula de que a arte existe para ser e criar artigos de luxo? A resposta define o nosso grau de barbaridade.
Primeiro vamos fazer algumas simulações dentro do nosso contexto local e histórico:
1. Os criadores em si
1.1 Dentro destes há o que se esmera para viver disso
1.1.1 Há o que consegue viver disso (este é um dos que apresenta ínfima chance de entrar para a história)
1.1.2 Há o que ama tanto a arte que não se importa de não viver disso
1.1.2.1 Ou ele tem outra renda
1.1.2.2 Ou ele vive na miséria (Um Vincent Van Gogh a cada milênio)
2. Os curadores
2.1-Os curadores
2.1.1 Os curadores que se tornam seres políticos com a intenção de captação de verba e por isso se tornam seres ideológicos, aderindo ao viés que este considera o favorecer financeiramente, existe sim hoje em dia, dentro deste perfil de curador que enriquece, o viés ideológico.
2.1.2 Os curadores que se tornam seres políticos apenas por que estão perdidos, pois mesmo aderindo à este viés não fazem a menor ideia de como podem transformar ele em um propósito rentável.
2.1.3 Os curadores apolíticos, Falam sozinhos, caso se articulem não dá em nada, pois faltam pares, geralmente lutam pelos do item “1.1.2.2 Ou ele vive na miséria”, o que os dá muita chance de também viver, pois apresentam conceitos de dignidade semelhantes
3- Temos os ativistas culturais
3.1- Os que o são por convicção, talvez de nascença. Falam sozinhos, caso se articulem não dá em nada, pois faltam pares, geralmente lutam pelos do item “1.1.2.2 Ou ele vive na miséria”, o que os dá muita chance de também viver, pois apresentam conceitos de dignidade semelhantes.
3.2 – Os ativistas culturais políticos. Não o são por convicção, não o são por nascença, são articuladores, pouco entendem de arte e claro que vão gastar os seus esforços aprendendo mais sobre política partidária e leis do que sobre arte, tendem a largar o ativismo cultural e saltar para a política. São para a arte a pior espécie (depois de Romero Brito).
Dentro da minha vivência, tenho aprendido rapidamente a discriminar todos estes atores sociais. Sobre o lado prejudicial deste caminho, valeriam mais umas 20 laudas escritas, sobre a nocividade do caminho político partidário e a péssima atuação das leis de incentivo, que alimentam todo esse processo distópico, mais 20.
Se Leonardo passou um bom tempo de sua vida, ganhando a vida pintando para “políticos”, nobres de sua época, esse cenário não se modificou, apenas tem sido mascarado com nomes e neologismos da geração Milenium.
Mas o processo de desvalorização da arte, e a total cegueira para a necessidade dela em nosso cotidiano, para a nossa saúde mental, para o nosso equilíbrio, ou como foi para os gregos: ferramenta real de justiça, como ferramentas de verdade, virtude e beleza.
Na minha humilde opinião, os tais 99 por cento que morreram anônimos, é que foram realmente artistas por profissão.
Erika Pessanha - artista plástica e produtora cultural