Isabel Correa participará pela ultima vez do Miss Rio de Janeiro |
No meio de uma viagem de duas horas entre a Barra e Belford Roxo, Isabel Correa, de 27 anos, sacolejava no ônibus enquanto dava entrevista sobre sua candidatura a Miss Rio de Janeiro. Era fim de tarde da última quinta, e ela vinha da prova do vestido que usará na noite dese sábado, na final do concurso, no Riocentro. Coincidentemente, no mesmo horário, sua concorrente, a petropolitana Nathália Bello, de 23, experimentava o modelo de gala com o qual enfrentará Nathália. No caso dela, numa loja de Petrópolis que resolveu ajudá-la no projeto de miss como patrocinadora. Quem ganhar não levará nada para casa, além de uma coroa. Na verdade, as duas estão de olho no Miss Brasil, em agosto.
Para Isabel, que já foi vice duas vezes no Miss estadual, é a última oportunidade: o limite de idade é 28 anos. Estudante de um curso técnico em recursos humanos e modelo, profissão que não lhe rende dinheiro suficiente para o mês, ela só conseguiu pagar a taxa de R$ 1 mil da inscrição graças ao apoio de uma rede de “missólogos”, como são chamadas as pessoas vidradas e especialistas nesses concursos. Gente de todo o Brasil e até de fora contribuiu na vaquinha para Isabel, que arrecadou R$ 3.500, investidos na taxa e também em roupas e deslocamentos.
— Sou como um Justin Bieber do mundo miss, desde os oito anos participo de concursos. Não estava em situação boa para pagar isso tudo, mas conto com uma torcida grande e consegui juntar esse valor — diz Isabel, que vive com a mãe, a avó e um irmão numa mesma casa na cidade da Baixada.
O pai é policial militar, enquanto a mãe trabalha vendendo salgados depois de, no ano passado, perder o emprego de auxiliar administrativa. Se antes tinha um salário de cerca de R$ 5 mil, hoje com os salgadinhos consegue de R$ 500 a 600. Já a avó é aposentada do estado. Ou seja: a família foi atingida em cheio pela crise econômica do Rio de Janeiro. Mas, com discurso de miss, Isabel tenta passar somente positividade, apesar das dificuldades. A palavra que mais repete é esperança:
— Tem que ter força para não perder a esperança de que as coisas vão melhorar.
Nathália, representante de Petrópolis |
Nathália, que faz faculdade de Nutrição em uma universidade particular de Petrópolis, mora com a mãe, funcionária do município, na área de RH. O pai é militar da Marinha, e, como conta a jovem, bem rígido com ela. Sua última coroação foi como rainha da Bauernfest, uma festa alemã tradicional da cidade. Há 17 anos que ela faz dança folclórica alemã, austríaca e polonesa: Nathália é bisneta de alemão, e segue a tradição familiar. Ela afirma que, graças ao apoio da mãe, que bancou a inscrição, está tendo a chance de, quem sabe, chegar ao Miss Brasil. Seu curso de nutrição é integral, e Nathália, mesmo fazendo trabalhos como modelo, depende dos pais:
— Vai ser uma conquista minha e dela (a mãe) — afirma, confiante no título de hoje.
Como uma possível futura representante do Rio de Janeiro, Nathália não se esquiva dos problemas enfrentados pelo estado. Articulada, mostra-se mais preocupada do que sua concorrente. Mas sem mostrar perspectivas negativas:
— Não só o Rio, mas o Brasil como um todo está passando por um momento de reestruturação. Estamos indo até a raiz do problema com as investigações. A Olimpíada teve o lado bom dos investimentos, mas por outro lado provocou o endividamento do Rio. Esses problemas serão resolvidos, mas não vai ser da noite para o dia — opina a Miss Petrópolis, que tem visto a qualidade de vida da sua cidade piorar. — Acredito que, por causa do desemprego, a cidade passou a ter muitos assaltos, ficando mais perigosa. E Petrópolis vive do turismo. Não podemos perder esses investimentos. É preciso que os as pessoas voltem a confiar na nossa economia.
O Miss Rio de Janeiro este ano ganhou patrocínio da marca de beleza Be Emotion, do grupo Polishop, e foi todo reformulado, de acordo com as regras válidas no Miss Brasil. Aliás, existem outros concursos de Miss Rio de Janeiro no estado, mas boa parte sem credibilidade. Nathália mesmo participou uma vez de um que teve o resultado contestado por mais de uma candidata. Ele foi eleita pelo júri popular, mas acabou não sendo agraciada no posto. Também já foi miss no estado num concurso patrocinado pela ONU, além de Miss Búzios — cidade que ela diz ter frequentado a vida toda. Isabel, Miss Belford Roxo pela quarta vez, já morou no Rio Grande do Sul, para onde foi depois de convidada a concorrer a miss do estado gaúcho pela cidade de Guaíba. Lá, conheceu o namorado atual, de Novo Hamburgo, filho de uma organizadora de concursos.
As duas bateram outras 33 inscritas no estado. A seleção em curso no Rio agora conta com a mesma organização do Miss Brasil. Diretora-geral do Miss Brasil, Karina Ades diz que os concursos anteriores estavam conectados a algo “cafona e antigo”.
— Reformulamos o conteúdo dos concursos, mais próximos aos realities e dos games e mais atrativo ao público jovem. Há também uma mudança da missão da miss: ela é uma influenciadora, uma representante. Não basta ser só bonita, ter medidas perfeitas. Tem que ter opinião, ser informada, culta e ligada à realidade — conta Karina.
Mas há ainda alguns requisitos mínimos. Não só ser miss da sua cidade, com reconhecimento da prefeitura, como idade entre 18 e 28 anos e, pelo menos, 1,68 metros de altura, padrão do Miss Universo. Existem medidas estabelecidas — o ideal é 90 cm de busto, 60 cm de cintura e 90 cm de quadril —, mas Karina ressalta que o mais importante é a “harmonia física”. Isabel tem 1,72 metro de altura, mais 90, 67 e 92 centímetros de medidas, enquanto Nathália tem 1,77 metro e 84, 67 e 92 centímetros de busto, cintura e quadril. No processo seletivo, tiveram que desfilar com uma roupa casual, depois de biquíni. E ainda responder perguntas de três jurados.
De olho na forma para disputa, as duas praticam crossfit, a moda das academias. Isabel reconhece ainda que é a “louca da dieta”:
— Uma vez fiquei no top 5 do Miss Rio de Janeiro, estava um pouco acima do peso. Este ano estou mais preparada psicologicamente, e decidi voltar mais magra. Estou com 58 quilos, mas quero perder mais — conta ela, que faz agora a “dieta da azeitona” (que não inclui só azeitona, vale destacar).
Isabel revela que gosta de competir, que os concursos são como um esporte. Mas tem plena convicção que, se não passar ao Miss Brasil, terá que investir mesmo é na carreira na área de recursos humanos. Nathália acredita que o Miss Brasil dá visibilidade e abre trabalhos na carreira de modelo, hoje acima da vontade de atuar como nutricionista. No momento, a petropolitana está solteira, mas “conhecendo alguém”. Em sintonia com os predicados valorizados numa miss no mundo contemporâneo, as duas veem também na vitória a oportunidade de colocoar em práticas projetos sociais. Nathália já trabalha com crianças com câncer, e pretende criar uma organização para auxliar pessoas com depressão e outros transtornos psicológicos. E Isabel dá aulas de modelo para meninas em Belford Roxo e sonha com uma instituição que preste ajuda no campo da saúde.
— A miss que ganhar tem que passar a mensagem de amor ao próximo e da importância da mulher na sociedade, independente da beleza. É a mulher que estuda, que é culta e luta pelo que acredita — resume Nathália.